Gestão da atenção primária na saúde suplementar: um diagnóstico técnico
Mesmo sendo reconhecida há décadas como um elemento central na organização de qualquer sistema de saúde, a atenção primária (APS) ainda não é amplamente adotada pelas operadoras de saúde suplementar no Brasil.
Esta é a conclusão do relatório técnico divulgado em março de 2021 pela Fundação Getúlio Vargas, resultado de um trabalho conjunto do Centro de Estudos e Planejamento em Gestão de Saúde (GVSaude) com o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS).
O documento faz uma análise qualitativa da gestão da atenção primária na saúde suplementar por meio de entrevistas individuais com gestores de operadoras selecionadas no Laboratório de Inovação sobre Experiências de Atenção Primária na Saúde Suplementar Brasileira.
Foram entrevistados 12 profissionais, sendo que quatro deles trabalhavam em empresas de medicina de grupo ou seguradoras, quatro em cooperativas médicas, três em operadoras de autogestão e um em uma organização filantrópica.
A seguir, você confere um resumo dos resultados desse estudo, que está disponível para download no site do IESS.
Por que fortalecer a atenção primária na saúde suplementar?
Para os autores do relatório, o fortalecimento da APS permite que os beneficiários a identifiquem como a porta de entrada do sistema, possibilitando que seu papel de coordenação do cuidado e integração com os demais níveis seja exercido de forma adequada.
Isso vai garantir uma melhor experiência do usuário ao longo de sua jornada de prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação.
Eles observam ainda que a atenção primária se distingue de outros tipos de cuidados, dada sua proximidade com o usuário e o seu papel dentro do sistema de saúde.
Em linhas gerais, o serviço de atenção primária nas operadoras tem as seguintes características:
- Os profissionais da APS, em geral, atendem a uma maior variedade de condições que os especialistas, fazem mais diagnósticos e solucionam afecções comuns
- Os profissionais de APS veem mais pacientes de repetição com novos problemas, pois têm a responsabilidade pelo cuidado à comunidade ao longo do tempo.
- A APS tem um maior percentual de atendimentos que podem ser classificados como de prevenção de doenças;
- Os atendimentos da APS implicam maior frequência de retornos (continuidade do cuidado) possibilitando maior proximidade entre o profissional e o usuário e sua família (vínculo) e melhor cuidado.
São essas características que fazem da APS uma porta de entrada também para os programas de promoção da saúde e prevenção de doenças (Promoprev).
Isso porque ela permite gerar dados sobre a evolução da saúde dos beneficiários que servirão para fazer o rastreamento de doenças e para identificar indivíduos de maior risco, que necessitam de uma ação mais ativa de prevenção e diagnóstico precoce.
Integração com a rede assistencial
Segundo o relatório da FGV, a atenção primária à saúde tem se mostrado efetiva nas operadoras que organizam sua gestão, particularmente quando esse serviço é oferecido de maneira integral e longitudinal, com coordenação do cuidado e acesso adequado.
Se trabalhada de forma integrada com a rede assistencial, ela pode estimular o autocuidado apoiado, melhorar a qualidade da assistência e reduzir redundâncias e desperdícios na operação dos serviços de saúde.
No entanto, apesar das várias iniciativas observadas na saúde suplementar, a APS ainda não atingiu a escala e a integração desejável com os diferentes níveis da rede assistencial.
O relatório alerta que, nas operadoras brasileiras, o cuidado ainda é composto por práticas fragmentadas e não se consegue identificar modelos assistenciais integrados e efetivos.
Com a oferta disseminada de serviços ambulatoriais e hospitalares sem integração e coordenação, a promoção da saúde e prevenção de doenças acabam se restringindo a ações isoladas.
Isso impede o desenvolvimento da atenção integral à saúde do beneficiário, principalmente no cuidado aos doentes crônicos.
Tecnologia na atenção primária à saúde
Os autores do relatório apontam ainda que o uso da tecnologia, particularmente no que se refere à telessaúde, pode contribuir decisivamente para aumentar o acesso dos beneficiários ao sistema.
Além disso, é fundamental que os registros eletrônicos de saúde sejam amplamente adotados e integrados ao restante da rede assistencial.
E que os dados levantados pelos atendimentos de atenção primária sejam utilizados por sistemas especializados na gestão de ações preventivas, para que possam alimentar análises de risco e a seleção de elegíveis para participar de programas de Promoprev.
Engajamento com a APS
A implementação e a escalabilidade da APS como ordenadora do sistema dependem também do engajamento contínuo dos usuários com o serviço.
Mas isso ainda esbarra na questão da liberdade de escolha do beneficiário em procurar serviços especializados como primeiro atendimento.
Segundo os entrevistados, muitos beneficiários têm preconceito com a atenção primária por associarem esse tipo de atendimento a uma visão pejorativa do SUS ou de serviços gratuitos. Outros acreditam que esta é apenas uma forma de “impedir o acesso aos especialistas”.
Os pacientes acostumados a consultar especialistas costumam se sentir inseguros diante de um médico de família, pois ele vai se interessar por diversos aspectos da sua vida que podem parecer confidenciais.
Outra dificuldade diz respeito à rotatividade dos clientes das operadoras, ou seja, os funcionários das empresas contratantes de planos de saúde. Isso dificulta a sobrevivência no longo prazo de um modelo de atenção primária integral e contínua.
Por fim, há o fato de que os profissionais encarregados de vender o plano muitas vezes não acreditam na atenção primária e, portanto, não priorizam a venda desse modelo.
Dessa forma, as operadoras precisam criar estratégias para garantir adesão e fidelidade aos serviços de APS, mostrando o diferencial e a relevância de um atendimento integral e oferecendo incentivos para os beneficiários.
É preciso transmitir a segurança de que a APS é mais fácil de acessar e mais disponível do que os serviços aos quais eles já estão acostumados.
Para isso são necessárias ações de conscientização, que devem focar no longo prazo para que os pacientes realmente sintam a diferença de estarem sob acompanhamento integral.
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